quarta-feira, 15 de junho de 2011

Ainda há esperança (apenas a minha opinião)


Desde os tempos da faculdade me envolvi com o movimento estudantil, e em seguida o movimento sindical. Nunca fui das militantes mais revolucionárias, mas sempre apoiei todo o movimento saído da classe oprimida, seja trabalhadora, estudantil ou movimentos sociais. Apesar de tudo isso, não simpatizava com o movimento #ForaMicarla. Inicialmente por achar que tirar Micarla era só abrir caminho para Paulinho Freire, que, na minha opinião, não seria diferente em nada da atual prefeita.

Durante os meses em que o movimento se configurou nas redes sociais eu o apoiei de forma tímida. Fiz minhas críticas à administração municipal, enviei convites via Facebook e fiz minha parte para tornar as hashtags do movimento, tendências nacionais e quiçá mundiais. Mesmo assim não fui às manifestações.

Sempre achei que é muito difícil se controlar multidões. Mesmo na minha tímida militância é possível testemunhar como sempre há os mais exaltados que nunca seguem as recomendações dos líderes, e, um movimento tão eclético quanto se apresentava o #ForaMicarla, a tentativa de ser organizado deveria ficar fora da realidade.

Minha outra crítica ao movimento se deu também à primeira manifestação ocorrida no Midway. Até hoje a maior do movimento. Com o mérito de ter colocado duas mil pessoas unidas em prol de uma causa justa, o movimento, a meu ver, pecou em escolher o horário e o local. O horário pegou exatamente a volta pra casa do trabalhador. Esse mesmo trabalhador que, assim como grande parte dos que fazem o movimento, é submetido a um péssimo sistema de transporte público e passa por ampla exploração em um dia de trabalho. Perdeu o movimento em perder o apoio da população. O local pra mim também prejudicou a manifestação, pois fechou o único acesso ao maior hospital de urgência e emergência da cidade.

Apesar de tudo isso mantive meu apoio, e minha indignação aumentou quando começou-se a falar em polícia para desocupação da Câmara. Aí vieram vereadores reclamando o direito de trabalhar. Aqueles mesmos que vivem em recesso e sempre ganham com convocações extras nas férias. Aqueles mesmos que suspenderam a sessão quando o ex-vice-presidente morreu. Ora vamos colaborar. Não precisa suspender sessão por um protesto ordeiro como aquele.

Várias vezes tentei ir à Câmara, mas os compromissos cotidianos me impediram. Com isso comecei a acompanhar o relato de amigos, jornalistas ou não, que estavam acompanhando o dia-a-dia daquele grupo que resolveu lutar pelo bem de toda uma cidade. Mesmo com toda a realidade contida nos relatos eu ainda mantinha um resquício de dúvida.

Nesta quarta-feira recebi um pedido do Sindicato para o qual trabalho que fizesse um registro fotográfico do movimento. Ao chegar lá, me deparei com um dos movimentos mais organizados que acompanhei na minha vida. O que eu julgava ser um movimento estudantil é na verdade amplo e plural. São pessoas completamente distintas unidas por um interesse em comum. O de viver em uma cidade administrada de forma competente e honesta.

O coletivo #ForaMicarla já tinha ganhado a minha simpatia antes do final da tarde. Momento em que os acampados começaram a se organizar para resistir ordeira e pacificamente à ameaça de repressão do braço armado do estado: a polícia. Naquele momento já tinha vontade de deixar a câmera fotográfica de lado e me juntar aos que entoavam músicas e gritos de guerra no pátio da Câmara Municipal de Natal.

Já com vontade de descer as escadas que dão acesso à presidência da Casa onde eu me mantinha para eternizar os momentos mais marcantes, me deparo com um momento lindo. Entra pátio adentro um dos manifestantes gritando: GANHAMOS.

Naquele momento todos se abraçaram e dali surgiu, de forma natural e espontânea uma das cenas mais emocionantes da minha vida. Com a bandeira do Brasil aberta, os manifestantes cantaram o Hino Nacional brasileiro. Chorei. Chorei de verdade, de emoção e felicidade por ver que as coisas em que acredito ainda podem ser o caminho sim.

E aquele movimento que eu tanto critiquei, de quem eu tanto duvidei, me conquistou e me acalentou. Parabéns a todos que fazem o Coletivo #ForaMicarla. Que esse seja o primeiro passo para uma luta muito maior. Que a instalação da CEI seja conquistada e que, apesar do rabo preso de grande parte dos edis. Que consigamos provar os desvios de verba pública e provocar a abertura do processo de impeachment da prefeita.

Por fim, aos que acham que jornalista tem que ser imparcial, sinto acabar com o sonho: não existe imparcialidade. Cada um defende o que acha certo. Eu defendo o direito de lutar por um mundo melhor.

Ana Paula Costa é jornalista, assessora o Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do Rio Grande do Norte e é diretora de comunicação e cultura do Sindicato dos Jornalistas do RN.

E o dia começou assim...

Natal, 15 de Junho de 2011




Sra. Prefeita Micarla de Sousa: nós, do Movimento #ForaMicarla, saudamos a sua iniciativa de realização de uma coletiva de imprensa. Porém, não reconhecemos a coletiva ocorrida ontem pela manhã como um sinal de abertura do diálogo. Pois um diálogo público pressupõe o debate de idéias e a construção de pautas para amadurecermos enquanto sociedade. Pressupõe uma firme postura de humildade e reconhecimento do outro.

O que todos puderam acompanhar foi a persistência de um discurso que é marcado pela desqualificação dos que contestam de maneira franca o seu trabalho, pela falta de auto-crítica e de disposição em participar de um debate amplo e aberto a todos; pela vexatória postura de fingir que a visível decadência da nossa cidade (nos mais diversos setores do serviço e da regulação pública) não tem nada a ver com o governo cuja principal figura é, ou supõe-se que seja, a senhora.

É claro que a administração municipal vigente não é a raiz de todos os problemas que afligem Natal; as práticas clientelistas, patrimonialistas e anti-democráticas vem de longe na nossa História. Acontece que chegamos a um ponto em que a indignação está saindo dos limites do conformismo e finalmente ganhando as ruas através de cidadãos que respondem ao chamado da denúncia de uma realidade insustentável de corrupção e mau uso dos recursos que pertencem ao povo. Essa indignação materializou-se no #ForaMicarla, um movimento horizontal, popular, suprapartidário e autogestionado.

E os motivos dessa mudança de consciência, mudança que é a força geradora do Movimento #ForaMicarla, são visíveis para todo cidadão. Basta que ela(e) queira e tenha condições de refletir criticamente sobre os problemas com os quais nos deparamos diariamente. Entre eles, podemos citar: a deprimente situação da Educação Básica na cidade; a ostensiva privatização do atendimento dos serviços de Saúde; os sucessivos aumentos na tarifa do transporte público, sem que haja sensível melhora no serviço; o notório superfaturamento de contratos, que vão desde o aluguel de prédios até a compra de copos descartáveis; o habitual uso da dispensa de licitação; os milhares de buracos e os constantes alagamentos nas vias públicas da cidade. Por último, e em especial (pela indiscutível má-fé que evidencia), cabe citar os injustificáveis gastos vultuosos em propaganda e publicidade institucional.

Como dissemos, nem todos esses problemas têm sua origem no atual governo municipal, Sra. Micarla. Mas certamente podemos concluir que o agravamento ou manutenção destes se deve à incompetência administrativa da sua gestão, que localmente é comparável apenas com a incompetência do poder Legislativo que deveria fiscalizar as ações da prefeitura.

Viemos à Câmara Municipal exigir que esse trabalho seja efetivamente conduzido. O ponto de partida que nós estamos reivindicando é a instalação da CEI dos Contratos Municipais. Desde que, obviamente, ela seja feita de uma forma que permita investigações incisivas, como a situação da cidade demanda. A posição de relatoria ou presidência, como a senhora e os vereadores bem sabem, não tem como característica principal a atração de holofotes. Dizer isso, como a Sra. disse ontem, demonstra da sua parte uma atitude de escárnio em relação ao exercício legislativo. Tão grave quanto a flagrante falta de disposição dos membros da Câmara de trabalhar em prol da lisura e do respeito aos eleitores que os conduziram ao exercício do poder.

De forma alguma questionamos a legitimidade das eleições de 2008. Tanto a Sra. quanto os atuais vereadores foram escolhidos democraticamente nas urnas. O que questionamos é a validade da permanência de indivíduos que não estão trabalhando de maneira minimamente satisfatória. Existem meios legítimos para canalizar esse sentimento e encaminhar a retirada destas pessoas do poder público, e estamos aprendendo a utilizá-los.

Temos o direito de nos expressarmos livremente e de emitir nosso juízo de valor, pois sabemos o valor do nosso trabalho, e porque pagamos os impostos que transferem uma parte do resultado deles para os cofres públicos municipais, para que vocês cuidem bem do que é da população de Natal. O tom da nossa voz é modulado pelo conhecimento de causa de quem se esforça diariamente para melhorar a sociedade através do nosso trabalho, mas não está vendo esse esforço ser plenamente aproveitado em decorrência das péssimas condições da cidade. O nosso valor pode ser verificado em nossa resistência aos sucessivos ataques desleais ao movimento, à nossa organização de índole pacífica (apesar das condições precárias de ocupar um prédio que teve o fornecimento de água cortado), e à pressão que temos sofrido de uma mídia que (você sabe na prática) em grande parte ainda é refém do coronelismo.

Se for preciso clarear ainda mais nossas exigências, que assim seja: queremos que o Legislativo investigue com real dedicação os contratos realizados pelo Executivo; queremos que, se comprovadas as diversas evidências de irregularidades, seja deflagrado um processo de impeachment contra a Sra. Instrumentos legais existem para que isso seja possível, e a Constituição brasileira estará (como tem estado, nessa ocupação) do nosso lado.

Queremos que, mesmo depois de tudo isso, o poder público MUDE o caráter da sua atuação em Natal. E passe a ter, DE FATO, um apego incondicional à prática da Democracia (que vai muito além do momento eleitoral) e aos princípios da gestão pública.

Lutamos respaldados pelos sentimentos e pela consciência de uma quantidade expressiva de cidadãos natalenses. Lutamos pela superação do momento de denúncia para que seja possível a anunciação de uma Natal melhor. Trazemos, espontaneamente e ao preço de muitos sacrifícios pessoais, uma mensagem dos natalenses para a Sra.:

Nossa indignação é a maior realização da sua prefeitura.

Você não sabia.

Agora você sabe.



Ass.: Movimento Popular #ForaMicarla